12.10.10

eLegs, mais um exoesqueleto de uso civil

Em uma apresentação bastante aguardada desde o HULC, a Berkeley Bionics lançou no dia sete dessa semana o eLegs, sua 4ª geração de exoesqueletos. Projetado especialmente para ser usado na reabilitação de pacientes com ferimentos ou  paralisia nos membros inferiores, o exoesqueleto foi apresentado por dois pilotos de teste, cada um com algumas dezenas de horas na máquina.


O HULC, feito para auxiliar soldados em missões longas e exaustivas, ao mesmo tempo em que permitia que eles carregassem até 100 quilos de equipamento sem sofrerem lesões, foi um dos primeiros projetos de exoesqueleto que chamou a atenção do público leigo, apesar de não ser o primeiro a ser financiado por empesas de desenvolvimento militar. Foi o projeto que colocou a Berkeley Bionics cabeça a cabeça com as concorrentes (como a Cyberdyne, vista aqui no post HAL 2010) e efetivamente no mercado. A empresa se tornou praticamente outra desde o licenciamento feito junto da Lockheed Martin, gigante da área militar, passando por mudanças muito óbvias principalmente em sua identidade, de laboratório-empresa  para empresa-laboratório.   

eLegs

HULC

Enquanto o HULC é o principal produto da série "Strength & Endurance" (Força & Resistência), o eLegs integra a série "Rehab & Mobility" (Reabilitação e Mobilidade) de produtos da BB. Além da capacidade de restituir a mobilidade do usuário, algo muito reforçado pelos pilotos de teste nos vídeos de apresentação é a recobrança de auto-estima e o senso de thrill. Como dito por Amanda Boxtel, vista nas fotos e vídeo, subir uma colina, poder preparar o próprio café da manhã de pé, ao balcão da cozinha, eram coisas que simplesmente não aconteceriam nunca mais. Até hoje.


Enquanto o valor científico, social e clínico é incontestável, sempre me pergunto sobre quando, realmente, teremos condições técnicas de manter um suit como tal, vestido e funcionando. Projetos como o eLegs ainda são grandes, pesados, desconfortáveis e algo perigosos para o usuário. O HULC sozinho pesa 15 quilos e você provavelmente estará carregando algo bem pesado se o estiver usando. Não é o tipo de queda que eu gostaria de sofrer.

É de se reparar também nas muitas abordagens a captação das intenções do usuário. Vemos sensores elétricos e microfones nos músculos, eletrodos captando disparos diretamente de neurônios, rotinas de caminhada pré-programados no CPU do exoesqueleto, e agora, com o eLegs, um sistema misto de leitura dos gestos do piloto. Qual é o mais eficiente? Qual tecnologia sobrevive e qual morre na próxima década? Difícil saber, mas com certeza vai ser demais.

1.10.10

Gancho Trautman DIY

O membro do Instructables.com marc.cryan fabricou em casa, com uma impressora 3d Cupcake da MakerBot Industries, um gancho Trautman, provando que o design industrial já saiu das mãos da indústria comercial. 


Apesar de não modificar o projeto original - a versão que ele imprimiu é uma das mais comuns - ele se esforça para explicar todo o processo de modificação do modelo virtual. Apesar de utilizar programas avançados no preparo dos arquivos, há opções mais simples para os iniciantes, como o netfabb e o skeinfoge



Setup para o designer hardcore

Para quem também quer fazer (e para quem tem um impressora 3d), aqui está o link para o instructable em questão.

Batphones te fazem ouvir melhor, sem implantes ou incisões!

Como é comum aos ciborgues, sentidos aguçados  são apenas um dos benefícios que implantes e anexos mecânicos podem trazer. Pros mais afoitos, que não querem esperar que as técnicas cirúrgicas necessárias sejam criadas, ja é possível ter uma audição aumentada.

Na verdade, o que Matthias Ries propõe com seus Batphones é um produto de auxílio para pessoas com problemas auditivos. Apesar de não tentar substituir os aparelhos, é uma solução certamente simples quando se precisa de um upgrade rápido.




Mais por Menos?

Quando falou sobre a crescente participação e importância da impressão 3D em projetos prostéticos, Scott Summit chamou minha atenção para algo ainda obscuro: como funciona a relação de valor em um sistema sem padrões? 


Scott Summit mostra uma das próteses
de sua empresa em uma palestra
Summit, que é diretor executivo da Summit e professor de design industrial na Stanford University, apresentou esse ano palestras sobre como a produção em massa assume uma característica totalmente oposta ao atual padrão: ao contrário da uniformidade constantemente desejada e certificada nos processos insdutriais, agora fabricar cada unidade diferente da anterior não é desafio maior que fabricar todas idênticas.

As possibilidades para as áreas médicas, cujos produtos são de design inerentemente pessoal, talvez ainda estejam além da nossa expectativa e muito além dos atuais projetos propostos, principalmente quanto a complexidade. Este é, inclusive, um dos pontos mais discutidos por Summit em suas palestras, em que ele trata o fator complexidade como algo gratuito. Não é mais caro fazer mais, ao contrário das técnicas produtivas tradicionais. Mantidas as devidas considerações - de que um modelista digital gasta, sim, mais tempo em um modelo mais complexo, por exemplo -, quando se fala em fabricação, ele tem considerável razão.

"Você quer todos os opcionais em um produto? O preço é o mesmo. Geometria é gratuita. Complexidade é gratuita."





Modelo em CAD de uma braçadeira
para pós operatório de ACL
Peça fabricada por sinterização

Além das aplicações estéticas e de interface, como o escaneamento da parte restante do membro amputado e encaixe preciso do adaptador gerado, a impressão 3d possibilita a interação de formas orgânicas e mecânicas. Com um modelo bem estruturado, de resistência garantida por simulações, pode-se chegar a soluções técnicas mais espaçosas e a eletrônica deixa de ser sinônimo de grande e desajeitado.


Mão scaneada por empresa especializada
 e em processo de modelagem
Peça pronta




Super Prosthetics Project

Becky Pilditch conduz no Royal Art College em Londres um experimento que mistura arte e prostética, com a ajuda de sua amiga Holly Frankling.

Opções, opções


Enquanto Becky descobriu seu interesse por membros mecânicos durante sua graduação em Engenharia Mecânica, Holly percebeu que a perda do antebraço esquerdo aos 29 anos devido a uma má formação vascular congênita dava a ela a oportunidade de experimentar - na pele - algo que poucos podem. Fabricando e modificando dezenas de modelos diferentes, variando os materiais e técnicas, as duas testam como o braço manufaturado pode ser um objeto de escolha e identidade da usuária.
Mantendo a propriedade sobre o espaço provido pelos variados braços que usa, Holly quer desafiar a idéia de próteses feitas para os outros, de forma semelhante ao desafio que as tatuagens já representaram ao excluir o tatuado do padrão.

Seu braço tem de ser, necessariamente, rosado?

Experimento No 5 - Mão de Vidro
Experimento No 6 - Dedos Transparentes

Experimento No 7 - Mão de Marionete



Set de Gestos  - Diferentes mãos para diferentes expressões


Holly tem hoje um site contando suas façanhas - como colocar pasta de dentes na escova, ou descascar uma banana - e atacando de designer de produto com seu próprio prendedor-de-cabelos-para-uma-só-mão

30.9.10

Fuga do Vale do Sinistro

Mencionado no post anterior, o Uncanny Valley Effect, mesmo que atualmente posto à prova, é de uma importância gigantesca no desenvolvimento de produtos que substituem em parte ou personificam de alguma forma o usuário. Noticiado em 1970 pelo cientista cognitivo Masahiro Mori, o efeito foi exemplificado em um gráfico hipotético:

O "vale" em questão é mostrado no gráfico como uma grande queda na familiaridade (eixo Y) com cópias com grande semelhança (eixo X) a um ser humano

Na idéia de Mori, a familiaridade que temos com objetos cai bruscamente - e fica "negativa" e se torna repulsa - quando o objeto é semelhante demais a nós mesmos. A linha pontilhada, que plota nossa reação a um objeto com movimento próprio tem no fundo de seu vale o zumbi, o supostamente o mais repulsivo dos simulacros. Uma réplica humana perfeita talvez passasse despercebida, mas a estranheza causada por cópias muito próximas mas imperfeitas tem sido posta a prova e se mantido de pé.

Exemplo disso é o FloBi, da Universidade de Bielefeld, Alemanha. Essa cabeça robótica foi desenvolvida especialmente como plataforma de teste de expressões e materiais que ajudem a evitar que robôs se pareçam com mortos-vivos.

As expressões te assustam? Se sim, pare de ler por aqui mesmo.





Apesar de subjetiva, uma conclusão dos pesquisadores é a de que plásticos rígidos, por serem mais facilmente manipuláveis com os atuadores mecânicos usados atualmente, sejam melhor capazes de evitar o Vale que o látex ou o silicone, por exemplo.

E o que seria de toda essa teoria sem uma confirmação pessoal? Assustador ou não?

CB2, que imita o aprendizado infantil 


Telenoid R1, direto de algum filme de terror




E o Efeito Vale do Sinistro continua!

Mais medo:



Bare Bones

O designer de produto norueguês Hans Alexander Huseklepp usa de um argumento que me foi bastante convincente ao propor a Immaculate, uma prótese conceitual que deixa de lado as típicas peles de silicone.


          

Como propõe Hans, as próteses encontradas no mercado hoje são esqueletos tecnológicos - mecânica ou eletrônicamente - cobertos por simulações de músculos e pele até certo ponto convincentes. Entretanto, quando "desmascarado" um membro prostético tende a causar repulsa ao observador, em uma reação sub-consciente de  "que diabos é isso?". Esse fenômeno, que pesquisadores chamam de Uncanny Valley Effect, algo como o Efeito Vale do Sinistro, é comum em aplicações robóticas que tentam replicar realisticamente características e comportamentos humanos.

A proposta do Immaculate é de driblar o tal Vale e "ao invés de tentar ser carne e osso, tentar ser algo além", nas palavras de Hans. A prótese funciona por integração com o sistema nervoso central do usuário.
"As juntas de esfera permitem total liberdade de movimento, as placas de corian permitem uma interface embarcada e sua interação com a malha têxtil cria uma identidade gráfica distintiva. Quero aplicar a mesma filosofia dos óculos, que de puramente funcionais chegaram a objeto de identidade e moda". 

Mais de Hans Huseklepp no Coroflot dele.


29.9.10

Prostética Open Source

Concordando com o que muita gente já disse, acho que a mudança mais significativa de todas na banalização da tecnologia é a possibilidade de se fazer em casa o que é feito nos grandes laboratórios industriais, só que melhor.

O Open Prosthetics Project (OPP) é uma comunidade criada como ponto de convergência para idéias na área prostética. Diferente das empresas que atualmente fabricam próteses e têm uma equipe de desenvolvimento fechada, o OPP está aberto a todos que tiverem algo a acrescentar, sem interesse comercial - daí o open.



O mais interessante é a capacidade de análise de revisão de soluções projetuais, já que boa parte dos usuários dos fóruns são usuários de próteses. São eles quem enxergam os pontos críticos que muitas vezes passam despercebidos aos não-amputados, antes mesmo da fabricação de um protótipo. Protótipos, aliás, tem sido pauta constante no site: atualmente se estuda a possibilidade de fabricar em massa a versão atualizada do Gancho Trautman, um aparelho para substituição em casos de amputação abaixo do cotovelo. Bastante simples e comum e barato antes do único fabricante fechar as portas, o Gancho é a menina dos olhos de muitos amputados, sendo remendados dezenas de vezes até simplesmente não terem conserto. 

            
Estudando o Projeto é possível ver o quão extraordinária a prototipagem é no desenvolvimento de produtos em que a forma é fundamental para a função. Processos como FDM (Modelagem por Fusão e Deposição, famosa pelas RapMan e outras impressoras 3d de baixo custo) são muito rápidos e implicam em baixíssimos custos ao mesmo tempo em que permitem uma avaliação detalhada da usabilidade do produto, que poderá, talvez, ser prototipado novamente por sinterização de alumínio ou aço.  E depois, claro, usado e abusado até quebrar e indicar qual o próximo passo. 

E para nos lembrar que a maioria das pessoas ainda não tem uma impressora 3d em sua própria garagem, só mesmo o bom e velho Lego.

Links

28.9.10

The Eye of the Beholder


Desenvolvida pelo Hospital-Universidade de Munique, a EyeSeeCam (ESC) é capaz de seguir seu olhar e filmar exatamente o local em que seus olhos estão focados.




São necessárias quatro câmeras para o funcionamento do aparato: duas lêem os movimentos dos olhos iluminados por LEDs infravermelhos e refletidos em lentes de acrílico, uma filma a cena como uma grande angular e uma última, ligada a servo motores e com zoom, segue ativamente o ponto de foco dos olhos.

Os resultados mais notáveis até então são em grande parte relacionados com oftalmologia clínica. Exames que requeriam que o médico observasse a movimentação dos olhos são feitos de forma muito menos subjetiva e muito mais precisa. Mais precisa mesmo: A ESC  filma com uma taxa de frames de 600Hz, resolução espacial de até 0.01 grau e sistema de monitoramento inercial, que segue os movimentos da cabeça do usuário, com 6 graus de liberdade. Para quem ainda não entendeu, isso é extremamente preciso. A prova disso são os artigos publicados sobre a aplicação do aparelho em revistas médicas como a PubMed e a ACM.

Fora o uso médico, as possibilidades de uso da ESC em relação com o design são inúmeras. Imagine testar se a interface que você projetou realmente funciona, se o usuário consegue identificar rapidamente as funções do produto ou se ele tem de procurar por elas e ainda, onde ele procura por elas. Com um sistema que segue o movimento dos olhos fica muito mais fácil criar um HUD projetado no visor de um capacete, sem os enormes problemas de paralaxe encontrados hoje. Ou em Design Gráfico - vide segundo vídeo -, se a ordem de leitura é realmente a esperada em um flyer ou painel, se a Gestalt está bem aplicada. A resposta tem boas chances de ser melhor que a do seu professor de PPF.  

EyeSeeCam - Visão geral








24.9.10

HAL 2010

Depois de ter dado uma volta de carona e quase atingido o pico do Monte Breithorn - 4.164 metros - em 2006, o japonês Seiji Uchida está pronto para um novo passeio, dessa vez solo. 

Hoje com 48 de idade e tetraplégico há 27 anos, Seiji quer usar o suit robótico HAL (Hybrid Assistive Limb) para fazer ele mesmo a caminhada até o Mont San Michel, na França. 

HAL


Originalmente projetado para auxiliar idosos com problemas de mobilidade e enfermeiros a levantar paciente, HAL foi anteriormente usado por um colega de Seiji na escalada do Breithorn. Com Seiji às costas, o amigo Takeshi Matsumoto se valeu da capacidade do exoesqueleto de detectar minúsculos impulsos elétricos nos músculos e ampliá-los com motores para quase chegar ao topo sem grandes dificuldades. A dupla não pode percorrer os últimos 400 metros de subida por conta do mau tempo.  

A motivação de Seiji para a empreitada é poder "provar que é possível para pessoas incapacitadas visitar locais históricos sem depender de instalações como elevadores", disse.

A fabricante Cyberdyne alega que um usuário do suit tem sua força multiplicada por um fator máximo de 10, sendo capaz de erguer mais de 70 quilos com um único braço. Quanto às dificuldades de controle nos casos de paraplegia (os impulsos elétricos são inexistentes) a solução dada é simples: um modo "robótico autônomo" é utilizado no lugar da detecção feita no modo de "controle voluntário". Nesse caso a pessoa é movida pela máquina em movimentos pré-programados.

21.9.10

Apresentação

Qualquer um que se interesse por tecnologia já considerou a idéia de um super-humano, meio carne, meio metal, o clássico ciborgue ultra-atlético, maquinalmente preciso, mais robusto e melhor adaptado às vicissitudes da vida.

Bem, sejam bem-vindos ao mundo real. Aqui ultra-atletas são os que conseguem sair da cama sozinhos, os mais precisos os que conseguem segurar talheres quase como uma pessoa padrão.O melhor adaptado consegue arranjar um emprego, o mais robusto é o que tropeça sem maiores danos.
Aqui é melhor ser mais carne que metal.

E assim chegamos à grande questão do tal mundo real: por quanto tempo mais carne continuará sendo melhor? Nos 200 metros rasos já se discute formas de "amortecer" as capacidades de atletas amputados, que teriam uma vantagem desleal sobre os que correm com suas pernas originais. É o tipo de coisa que me despertou pra considerável dimensão que essa aplicação de tecnologias está tomando e o quão rápido isso vem acontecendo. A criação individual ou de pequenas comunidades DIY cresce sem parar e o interesse nunca foi tão forte.

E finalmente chegamos à idéia do human : extended: reunir informação e analisar o que tem sido feito pela melhoria da qualidade de vida, extensão das possibilidades pra quem perdeu - ou não - algum membro, capacidade motora ou coisa que o valha.

Próteses, exoesqueletos, aumentadores de realidade, o que quer que seja, se fizer metal valer mais que carne, é bem vindo.